Divagações
Divagando & andando
- Nada
- Lugar do Telefone
- É isso?
- And we keep driving, into the night...
- Da série 'posts longos e sem sentido algum'
- O jovem
Nada
Aí, quando as pessoas descobrem que a gente não acredita 'em nada', a primeira coisa que perguntam é "e aí, depois que morre, você acha que não acontece mais nada?", e a gente fica meio "é, acabou, acabou".
Mas pensando melhor, seria melhor devolver a pergunta:
"Como assim, e tu acredita na eternidade? é a eternidade, não são 10, 100 ou 1000 anos, é pra sempre. Pensa bem: depois de 'morto', não se tem mais um corpo físico, certo? Então não precisa comer. Se não precisa comer, não precisa trabalhar. Se ninguém trabalha, então não tem nada pra fazer - não tem televisão, não tem uma bola pra chutar, um livro pra ler, nem nada. Pensando nisso, tenta passar um fim de semana sem fazer absolutamente nada - nem dormir, porque se não se gasta energia, não precisa dormir. Agora, pensa que é isso, por anos e anos a fio, sem possibilidade de mudança. Tu não ia querer estar morto?"
Mas na verdade, não é que não acredito em nada. A única coisa que acredito é que ninguém sabe nada. E o que se sabe, está errado. Porque não tem jeito de se saber como é algo sem que ninguém tenha ido lá e voltado pra contar.
Lugar do Telefone
Semana passada, tinha faltado luz em casa, após eu sair do trabalho.
Depois de subir 12 andares à pé, fui pegar o telefone pra ligar pra minha esposa e avisar que estávamos sem luz em casa.
Tateando no escuro, fui procurar o telefone no lugar onde ele sempre fica, mas pra minha surpresa, não estava lá.
Depois de acender uma vela e mesmo assim não encontrar, decidi ligar do celular, para ver onde ia tocar. Acontece que ele estava no banheiro.
Minha reação foi "nossa, o que telefone está fazendo no banheiro?", mas tudo bem.
Depois de usar o telefone, devolvi no lugar de costume.
2 minutos depois de entrar no banho, o telefone toca, e eu preciso sair do chuveiro, todo cheio de sabão, pra atender. Nessa hora eu percebi que o lugar do telefone deveria ser no banheiro mesmo.
É isso?
Uma das piores coisas que tu pode fazer é pegar implicância com algo.
À partir desse momento, tudo que é relativo à essa coisa parece ser ruim.
E o pior é que é muito fácil pegar implicância com as coisas.
Um bom jeito de evitar esses problemas é pegar implicância com coisas inúteis, como por exemplo, com expressões que as pessoas usam.
Uma coisa que vejo as pessoas falando e que me dá um nó é o tal do "é isso?".
Por exemplo:
-Ganhei um real.
-Ah, você ganhou um real, é isso?
Ou seja, a pessoa repete o que foi dito exatamente agora, e termina com um "é isso?". Às vezes, dá vontade de dizer "não, é exatamente o contrário disso que acabei de dizer agora".
O que torna isso irritante é o fato de que se fala desse jeito o tempo todo.
É ainda mais irritante do que quando escrevem sem pontuação.
And we keep driving, into the night...
Fico bobo quando vejo alguém que sabe dirigir bem, trocando de marcha. A gente percebe que mudou algo mas não sabe bem o quê, e as coisas começam a andar mais depressa. Ou mais devagar, dependendo da situação, mas a mudança é quase imperceptível.
Tem outros que se atrapalham na hora de mudar, trocam pés pelas mãos, e arranham a caixa de câmbio do carro - e aí todo mundo percebe que o infeliz fez cagada, por causa do barulho.
Eu sempre tive algum problema pra mudar. Não é aquela coisa sutil, onde só se percebe que mudou, mas por outro lado, não chego a fazer nenhum esparro. Na verdade, eu quase paro, por causa do medo de trocar pés pelas mãos. Espero tempo demais pra tomar a próxima ação, e acabo perdendo velocidade. Aí, eu passo pra um nível mais alto, mas nem se percebe. Só dá pra perceber mais tarde quando tenho que diminuir a marcha, por ter escolhido um caminho que me levou pra uma curva brusca.
Mesmo tendo rodado pouco em alguns tipos de estradas, e existindo outros tipos que eu sequer passei, acho que com essa quilometragem que já tenho eu consigo perceber quando eu estiver numa velocidade boa, numa estrada boa. O que é melhor do que só perceber depois que já se perdeu velocidade, ou quando a estrada fica esburacada.
Eu acredito que engatei uma marcha acima, mas só vou saber mais tarde. De qualquer jeito, já soltei a embreagem, e ainda não ouvi o arranhão.
Acho que é um bom sinal.
Da série 'posts longos e sem sentido algum'
Abaixo a Anarquia!
A anarquia.
Acima, a anarquia.
O jovem
O jovem tinha sonhos. O jovem tinha esperanças, queria mudar o mundo. O jovem poderia mudar o mundo, e era o que ele ia fazer.
O jovem achava que sabia que ia ser difícil, mas também achava que não ia desistir.
Provavelmente porque era jovem.
O jovem sabia que pra mudar o mundo, ia precisar de forças. E ia precisar aprender a lutar.
O jovem, então, busca treinamento. E quem o treina é o homem.
O homem já tem muita experiência, já lutou muito, mas já não tem sonhos. Ele sabe que esses sonhos não vão mais se realizar.
Provavelmente porque tem muita experiência.
O jovem fala de suas idéias revolucionárias, seus desejos de mudar o mundo, mas o homem ensina que não é assim que funciona. Parece que tudo que o homem ensina ao jovem vai contra os princípios dele, então ele decide que, quando chegar a vez dele, não vai ser assim. E ele não entende porque (ou porquê, ou por quê, ou por que) o homem age dessa maneira.
O jovem, então, termina o seu treinamento. Agora ele é um homem também. E sai pra fazer seu trabalho.
Ele realiza o seu trabalho, do jeito que lhe foi ensinado, e se orgulha disso. E, pra provar que o homem estava errado, ele faz um pouco mais, além do que devia.
Ele logo tem outro trabalho à fazer, e novamente, orgulhosamente, faz um pouco à mais.
Então ele decide sempre fazer um pouco à mais. Porque o homem estava errado, e porque ele tem princípios e vai mudar o mundo.
Um dia, o jovem (vou continuar chamando assim porque deu preguiça de criar um nome) está cansado, e faz apenas o trabalho normal. O cliente pergunta 'vai fazer pela metade, meu jovem? você já foi melhor'.
Ele sempre fez à mais, mas quando faz apenas o necessário uma primeira vez, é como se ele sempre fizesse o necessário e desta vez ficasse devendo.
Mas tudo bem, ele é jovem e vai mudar o mundo.
O tempo passa, e o jovem não consegue mudar o mundo. E vai ficando cansado, cansado das exigências, pois ele deixou as pessoas mal-acostumadas, e essas não mostram muito reconhecimento. Só pedem mais, e cada vez mais. Como se fosse obrigação dele.
Um dia o jovem anda cabisbaixo, desanimado, quando encontra seu velho mestre.
-Mestre, eu não entendo. Eu lutei, me esforcei, tentei mudar o mundo, mas só o que aconteceu foi que se aproveitaram de mim. E ainda reclamaram quando eu fiz somente o necessário!
O mestre, do topo de sua grande montanha de sabedoria, lhe disse:
-Psss! tu entendeu tudo errado, meu bruxo. Negócio é o seguinte: tu vai lá, faz o que te pediram e deu. Cabô, não tem muito papo não. E mete a faca no rim, cobra os zóio da cara, que só aí te dão respeito, tá me entendendo? Então larga essa frescurinha de agradá cliente e não fica aí choramingando pelos canto! Mudar o mundo? primeiro tu faz o teu lado, se sobrá tu até dá uma mão, mas primeiro enche o teu!
P.S.: isso é só uma viagem que me veio na cabeça. eu obviamente não penso assim. nunca quis mudar o mundo mesmo...
P.S. 2: eu devo ter escrito isso lá por 2007-2008, então não vem dizer que estou falando de "quiet quitting" (apesar de estar)